terça-feira, 31 de agosto de 2010

Indiferença.

Ele estava sentado em sua habitual mesa, e sua habitual cadeira de couro preto desbotado.
Sentia uma paz incomum. A falta de vínculos, de preocupações, uma frieza agradável, e ao mesmo tempo devastadora.
Significava que estava livre. Não tinha a quem ou ao o que se preocupar. Não havia prestação de contas, mensagens de cobrança ou coisas do tipo ao fim do dia. Signficiava que nenhuma alma o notava alí, e que ele passava invisível por onde estivesse.
Respirou fundo, levantou-se da cadeira e andou. Ficou de frente ao telefone. Nada.
Não havia a quem recorrer.
E ele se deixou dominar por ela.
Se deixou sentir a textura agradável e a trranquilidade que a solidão lhe trazia.
Ele perdeu a capacidade de cultivar, criar ou manter um laço.

Ele perdeu a capacidade de sentir algo.
E, rezo para que seja por pouco tempo.

domingo, 15 de agosto de 2010

Domingo.

Via um céu cinzento de mais uma manhã de domingo.
Folhas passavam pra lá e pra cá. O vento gelado batia sutil como concreto em sua face.
Mas ele gostava. Sentia prazer e conforto imensuráveis apenas de estar deitado na grama coberta de orvalho, numa manhã cinzenta e gelada de domingo.
O vento o fazia lembrar de quão frio e quão aconchegante era estar em presença dele. Os assovios eram parecidos, o gelado lembrava cada timbre da voz. Cada folha que passava, que ficava presa em seu cabelo, que tocava seus braços ou, simplesmente passava, o fazia recordar de cada singelo momento em que passou com ele. Cada pequeno momento, de segundos que se tornavam eras, de palavras pequenas com efeitos devastadores que aguardava cada noite para ouvir, passavam pela cabeça dele como um filme.
O levava no peito, o levava na mente.
Imaginava o futuro. Apenas imaginava. O imaginar pertencia a ele, pois este foi o único fragmento que sobrara do todo corrompido daquele garoto.
O passar de mãos e o maltrato intenso o deixaram num estado de desacreditar, num estado indiferente. Ele mais nada queria, almejava ou acreditava. Ele apenas esperava pelo momento em que a paz chegaria e o levasse ao adiante.
Porém, a imagem daquele garoto o fazia sentir o verde do que era ter esperança. E por ele continuaria.
Do canto de um dos olhos cai. E se mistura ao orvalho na grama.
E adormece, sob o céu azul de mais uma manhã de domingo.